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Presidente do CC no Congresso Mundial sobre Justiça Constitucional

Outubro 30, 2025

A Veneranda Juíza Presidente do Conselho Constitucional (CC), Prof.a Doutora Lúcia da Luz Ribeiro, participou, esta quarta-feira, em Madrid, Espanha, como oradora principal, no VI Congresso da Conferência Mundial sobre Justiça Constitucional, sob o lema “Os Direitos Humanos das Gerações Futuras”, que conta com a participação de 85 cortes constitucionais mundiais e mais de 500 participantes de todo o mundo.

A Conferência aborda quatro temáticas actuais, nomeadamente,  “A preservação dos Recursos Naturais e do Ambiente”; “Preservação do Património Cultural da Humanidade”, «Acesso ao conhecimento científico e às novas tecnologias” e “Independência dos Tribunais Constitucionais”.

Na sua comunicação, sobre o tema “Acesso ao conhecimento científico e às novas tecnologias”, a Professora destacou, entre outros aspectos, a questão do reconhecimento formal de um direito à conectividade digital; da existência de instrumentos adequados para preservar o direito dos cidadãos a receber informação precisa através das redes sociais; existência de mecanismos para proteger o cidadão contra o uso indevido de tecnologias de vigilância, de recolha de dados ou outros meios de controlo social que possam ter efeitos indefinidos; existência de mecanismos para o proteger o cidadão contra o uso indevido de sistemas de inteligência artificial que possam ameaçar o pleno gozo dos direitos humanos pelas gerações futuras; e a existência de jurisprudência relevante acerca desta matéria.

A sua comunicação consistiu na sistematização e comentário crítico às respostas dadas pelas cortes constitucionais membros da Conferência Mundial a um inquérito, exercício que permitiu aferir os níveis de evolução e desenvolvimento do direito fundamental à informação digital, com destaque para os avanços e impactos da Inteligência Artificial. Referiu que o desenvolvimento económico e social de cada país determina os níveis de acesso ao conhecimento e às novas tecnologias, assim como a regulamentação dessas matérias e a intervenção dos tribunais constitucionais para assegurar o pleno exercício deste direito. Destacou que alguns países, como é o caso de Moçambique, ainda estão numa fase embrionária de regulamentação de tecnologias como a Inteligência Artificial, que aumentam o risco de lesão de direitos fundamentais.

Rematou, por isso, que a regulamentação da Inteligência Artificial e o aprimoramento científico das cortes constitucionais para lidar com a nova tecnologia constitui parte fundamental dos actuais desafios globais.

E não terminou sem fazer referência à relevância deste tema para o progresso social, económico e intelectual dos povos, uma vez que a tecnologia aplica o conhecimento científico para resolver problemas, transformar a sociedade e criar soluções mais eficientes e inovadoras, como avanços em diversas áreas, nomeadamente, saúde, educação, produtividade e, portanto, na promoção dos direitos fundamentais, sua garantia e defesa através das nossas cortes constitucionais.

A Conferência Mundial sobre Justiça Constitucional é um fórum que reúne 124 tribunais constitucionais, conselhos e cortes supremas de África, das Américas, da Ásia/Oceânia e da Europa. Promove a justiça constitucional como um elemento fundamental para a democracia, protecção dos direitos humanos e o Estado de direito.

O VI Congresso da Conferência Mundial sobre Justiça Constitucional, que se realiza de três em três anos, iniciou na terça-feira, dia 28 de Setembro, e termina na próxima sexta-feira, dia 31.

Eis na íntegra o discurso da Presidente do Conselho Constitucional.

Seção III: ACESSO AO CONHECIMENTO CIENTÍFICO E ÀS NOVAS TECNOLOGIAS

Sua Excelência o Presidente temporário do WCCJ7,

Ilustres membros deste painel,

Ilustre Relator do painel,

Ilustres juízes e ministros dos tribunais constitucionais e órgãos equivalentes,

Minhas senhoras, meus senhores.

Saudamos calorosamente o Tribunal Constitucional do Reino da Espanha pela maravilhosa e bonita cerimónia que organizou, com estilo e elegância.

Agradecemos, igualmente, a recepção que tivemos, desde a chegada, e o atendimento que temos vindo a experimentar, por deixar memórias incomensuráveis para o futuro.

Parabéns.

A nossa apresentação está enquadrada no tema desta Sessão C – “Acesso ao conhecimento científico e às novas tecnologias”.

O objectivo principal é apresentar de forma sistemática as respostas ao inquérito feito sobre a temática atrás aludida. A temática “Acesso ao conhecimento científico e às novas tecnologias” é fundamental para o progresso social, económico e intelectual dos povos dos nossos países.

Esta importância é justificada pelo facto de que a ciência visa compreender e explicar o mundo, enquanto a tecnologia aplica esse conhecimento para resolver problemas, transformar a sociedade e criar soluções mais eficientes e inovadoras, como avanços em diversas áreas, nomeadamente, saúde, educação, produtividade e, portanto, na promoção dos direitos fundamentais e sua garantia e defesa através das nossas cortes constitucionais.

Do inquérito disponibilizado, 68 tribunais e instituições equivalentes membros da Conferência Mundial sobre Justiça Constitucional responderam, de um universo de 124 membros.

O inquérito era constituído por cinco questões, assim dispostas:

  • O direito à conectividade digital (acesso à Internet) é reconhecido nos instrumentos regulatórios relevantes do seu país?
  • Existem instrumentos adequados para preservar o direito dos cidadãos a receber informação através das redes sociais, com garantias de precisão?
  • O seu sistema jurídico possui mecanismos para proteger contra o uso indevido de tecnologias de vigilância ou de recolha de dados ou outros meios de controlo social que possam ter efeitos indefinidos? Em caso afirmativo, quais são esses mecanismos?
  • O seu sistema jurídico possui mecanismos para proteger contra o uso indevido de sistemas de inteligência artificial que possam ameaçar o pleno gozo dos direitos humanos pelas gerações futuras? Em caso afirmativo, quais são esses mecanismos?
  • O seu Tribunal emitiu alguma decisão relevante sobre estas matérias? Em caso afirmativo, poderia descrevê-la brevemente?

A metodologia que adoptámos, para melhor satisfazermos o objectivo apresentado, é a análise dos aspectos comuns das respostas apresentadas em cada pergunta e, sequencialmente, a exposição de aspectos específicos diferentes, seguido de um pequeno balanço apreciativo.

PERGUNTA 1: O direito à conectividade digital (acesso à Internet) é reconhecido nos instrumentos regulatórios relevantes do seu país?

  1. Países com Constituição, lei específica ou obrigação legal de acesso à Internet

Das respostas dadas, constatou-se que 18 países possuem uma legislação específica sobre o acesso à internet, onde se destacam a Finlândia (Communications Market Act); o Japão, com quase 97% dos lares com acesso à Internet de banda larga; e o Brasil (Lei nº 12.965/2014 – “Marco Civil da Internet”), com cobertura territorial. 

Nas ordens jurídicas moçambicana e angolana, o direito ao acesso à internet tem respaldo no texto constitucional, através dos artigos 48 e 71 (Moçambique) e nos artigos 34 e 40 (Angola).

Aspecto de diferenciação está no grupo de 35 países que responderam que o direito de acesso à Internet é tratado como fazendo parte de conteúdo essencial de outros direitos e liberdades fundamentais.

É o caso da União Europeia, onde o reconhecimento e protecção do acesso à internet é tido como fazendo parte do conteúdo essencial do direito à liberdade de expressão, da liberdade de imprensa, do acesso à informação, etc. Este reconhecimento é feito pela Directiva da EU n.º 2018/1972 do Parlamento Europeu e do Conselho da Europa, de 11 de Dezembro de 2018. Neste sentido, existem decisões da Corte Europeia de Direitos Humanos concretizando e efectivando este direito; outro aspecto diferenciador tem a ver com os Estados Federais, onde o direito de acesso à internet é garantido por via de uma regulamentação dos Estados federados e não por via de um acto federal.

  • Os casos de tratamento jurisprudencial do direito de acesso à internet

Outros tantos países, como Eslovénia, Índia e Turquia, já emanaram decisões nas respectivas jurisdições constitucionais que consideram que as restrições ostensivas e arbitrárias à internet, incluindo o seu corte, violam direitos. Essas decisões exploram mais o lado das limitações e restrições de direitos do que consagrar obrigações positivas de prover conectividade.

Contudo, as interpretações jurisdicionais são feitas em função da legislação de cada país.

Há, entretanto, alguns países que têm leis de telecomunicações, regulamentos de universalização ou políticas para expansão do serviço, mas frequentemente sem exigência de que o Estado garanta conectividade mínima para todos ou que haja soluções legais claras em caso de não cumprimento.

Para estas situações, a sociedade civil tem recorrido ao judiciário ou a acções regulatórias para responder a restrições ao acesso ou a regulamentos que oneram excessivamente os usuários.

Este aspecto indica que há entendimento de que limites à conectividade, tarifas elevadas ou cortes arbitrários podem violar direitos constitucionais existentes.

No caso de Moçambique, houve acções da sociedade civil (uma providência cautelar junto de um tribunal judicial em Novembro de 2024) exigindo o restabelecimento imediato do acesso à internet, após restrições durante o período pós‑eleitoral.

  • Países sem nenhuma referência

Neste conjunto de países, em número de 15, não há qualquer menção legal ou constitucional ao acesso à Internet, conectividade digital nem ao papel das tecnologias de informação como direitos fundamentais. Nestes contextos, o tema da conectividade aparece apenas em políticas económicas ou em estratégias de desenvolvimento (exemplo do Canadá) e não como parte de um quadro legal de direitos humanos.

Temos quatro países do bloco da UE que somente fizeram menção ao mecanismo europeu (Código Europeu das Comunicações Electrónicas).

PERGUNTA 2: Existem instrumentos adequados para preservar o direito dos cidadãos de receber informação através das redes sociais, com garantias de precisão?

De uma forma geral, dos 124 países membros da Conferência Mundial sobre Justiça Constitucional, 68 países responderam a esta questão. Foi possível dividir as questões em quatro grupos:

  1. Dado que o advento das redes sociais é relativamente recente, temos um primeiro grupo de países, o maior, em que esta questão encontra respaldo na Constituição, de uma forma geral, enquadrada no direito universal à informação e liberdade de expressão, nomeadamente, Arménia, Azerbaijão, Bulgária, Índia, Iraque e Lituânia, cujas respostas a esta questão são encontradas apenas nas respectivas Constituições.

Temos, ainda neste primeiro grupo, países que recorrem tanto à Constituição como a outras leis nacionais e/ou comunitárias, como Andorra, Dinamarca Bielorrússia, Bélgica, Cambodja, Croácia, Chipre, Finlândia, Alemanha, Hungria, Itália, Kazaquistão, Quirguistão, Marrocos, México, Mongólia, Paquistão, Peru, Portugal, Espanha e Moçambique.

No caso específico de Moçambique, esta questão encontra resposta na Constituição, por via do seu artigo 71, referente ao uso da Informática, nos seus números 1, 2, 3 e 4, em articulação com a Lei n.o 34/2014, de Acesso à Informação, Código Penal e Lei de Combate ao Cibercrime.

Em resumo, dos 68 países que responderam ao inquérito, 52, equivalentes a 76,4%, afirmam possuir instrumentos adequados para preservar o direito dos cidadãos a receber informação através das redes sociais, com garantias de precisão, desde a Constituição, lei específica ou diversas leis ou ainda a legislação comunitária da União Europeia, sendo que os restantes 16, equivalentes a 23,5%, não dispõem de instrumentos para o efeito.

PERGUNTA 3: O seu sistema legal tem mecanismos de protecção contra o uso indevido de tecnologias de vigilância ou de colecta de dados ou outros meios de controlo social que podem ter efeitos perduráveis? Se sim, quais são esses mecanismos?

O desenvolvimento de novas tecnologias de informação que nos têm sido brindadas a cada dia e o seu uso crescente nos últimos tempos, a Inteligência Artificial em particular, chamam a necessidade de reflectirmos na seguinte questão básica: existem mecanismos legais para responder ao impacto do uso indevido das tecnologias de vigilância, garantindo que se observe o direito à privacidade?

Eis a tabela de respostas ao inquérito sobre o acesso ao conhecimento científico e a novas tecnologias:

Países membros da (Conferência Mundial Sobre Justiça Constitucional)124100%
Total de países que responderam ao questionário6955.6%
Países que não responderam ao questionário5544.4%
Países que responderam com base na Constituição2923.4%
Países que responderam com base em instrumentos específicos3024.2%
Países sem referência de instrumento legal75.6%

Da tabela acima, pode aferir-se que, de um total de 124 países membros da Conferência Mundial Sobre Justiça Constitucional, apenas 69 responderam ao inquérito, o que representa uma margem de 55.6%; 55 países não responderam ao inquérito, o que representa uma margem de 44.4%; 29 países, com a margem de 23.4%, encontram resposta à questão em alusão na Constituição; 30 países têm instrumentos específicos, o que representa uma margem de 24.2%; e sete (7) países, a margem de 5.6%, não fazem referência a nenhum instrumento legal.

Andorra, Bélgica, Croácia, entre outros, encontram uma base legal para responder à questão acima no texto constitucional e alguns casos ainda se apoiam noutros instrumentos específicos, incluindo instituições, para a salvaguarda do direito à privacidade.

A Constituição do Principado de Andorra, nos artigos 14 e 15, garante os direitos fundamentais, como o direito à privacidade e à intimidade. Estes direitos proporcionam um marco legal para impugnar o uso indevido das tecnologias de vigilância.

Este país e vários outros da União Europeia, seja a nível do texto constitucional seja por meio de um instrumento específico, encontram alicerces legais para responder a esta questão no regulamento geral de protecção de dados [General Data Protection Regulation – (GDPR), adoptada em 2016 e efectiva desde 2018 – lei comunitária que governa como as organizações lidam com dados pessoais dos residentes da União Europeia].

Bons exemplos podem ser referidos, como a experiência da República da Angola, que, além de adoptar instrumentos específicos para lidar com esta questão (Lei nº22/11 de 17 Junho – Lei de Protecção de Dados Pessoais e a Lei nº2/20 de 22 de Janeiro – Lei de Videovigilância, que regula a implementação e operação de sistemas de videovigilância, com regras rigorosas para prevenir a monitorização excessiva ou injustificada; Limites ao Âmbito da Vigilância: a vigilância em habitações privadas ou edifícios habitados é estritamente proibida, salvo autorização expressa de uma ordem judicial ou consentimento do ocupante), criou a Agência de Protecção de Dados (ADP), que funciona como autoridade central para a fiscalização e supervisão junto das entidades responsáveis pelo tratamento de dados pessoais.

Em Moçambique, ainda não há uma lei única, abrangente e plenamente operacional de protecção de dados pessoais.

Sobre a protecção contra o uso indevido de tecnologias de vigilância ou de colecta de dados ou outros meios de controlo social que podem ter efeitos perduráveis, o actual quadro legal encontra alicerces na Constituição da República, nos números 1,2,3 e 4 do Artigo 71, que proíbem autilização de meios informáticos para registo e tratamento de dados individualmente identificáveis relativos às convicções políticas, filosóficas ou ideológicas, à fé religiosa, à filiação partidária ou sindical e à vida privada; de dados pessoais constantes de registos informáticos; o acesso a arquivos, ficheiros e registos informáticos ou de bancos de dados para conhecimento de dados pessoais relativos a terceiros; a transferência de dados pessoais de um para outro ficheiro informático pertencentes a distintos serviços ou instituições, salvo nos casos estabelecidos na lei ou por decisão judicial.

Existem outros instrumentos adjacentes, como a Lei das Transacções Electrónicas (Lei n.º 3/2017, de 9 de Janeiro), que estabelece obrigações para o tratamento de dados electrónicos pessoais – exige que a recolha de dados informe claramente os objectivos e a identidade do “processador” do dado; Regulamento de Registo e Licenciamento dos Provedores Intermediários de Serviços Electrónicos e Operadores de Plataformas Digitais (Decreto 59/2023), um instrumento recente, que regula plataformas digitais e provedores intermediários, impondo responsabilidades de privacidade e segurança no tratamento de dados; Política de Segurança Cibernética e sua Estratégia (Resolução n.º 69/2021, de 31 de Dezembro, do Conselho de Ministros), que é também parte do quadro normativo que trata de ameaças cibernéticas, que podem incluir vigilância indevida ou abusiva, embora não seja especificamente uma lei de vigilância, a Lei do Direito à Informação (Lei n.º 34/2014), que estabelece o direito à informação.

Em processo, existe a proposta de Lei de Protecção de Dados Pessoais. Esta proposta tem por objectivo criar um quadro legal que assegure os direitos dos cidadãos no ambiente digital, promovendo transparência e responsabilização dos agentes que tratam de dados.

A inexistência de mecanismos de protecção que regulam o uso das tecnologias de vigilância, colecta de dados ou outros meios de controlo social que podem ter efeitos perduráveis, como é o caso de  países como Burundi, Comores, República Democrática do Congo, Dinamarca, Letónia, Marrocos e Peru, que tanto a nível constitucional tanto a nível de instrumentos específicos abre espaço para o cometimento de acções inimagináveis que podem atentar contra a privacidade de dados pessoais. Deste modo, importa exortar os países que não dispõem de nenhum instrumento legal que estipule limites ou restrições no uso da tecnologia de vigilância a fazerem-no, de forma a garantir a segurança dos dados pessoais do cidadão.

É dessa reflexão que urge a necessidade de se apetrechar o texto constitucional e/ou instrumentos legais, visto que, hoje, as tecnologias avançadas proliferam como um fenómeno global, devendo o instrumento regulador ser pontual, dinâmico e compatível com a natureza da tal tecnologia de vigilância, ajustar com rigor a base de existência de leis específicas que respondam à questão em alusão, na sua complexidade, garantido acima de tudo a protecção da vida privada do cidadão. Ademais, precisa-se de se pautar por mecanismos de penalização rigorosa, para desaconselhar o uso indevido das tecnologias de vigilância.

PERGUNTA 4: O seu sistema jurídico dispõe de mecanismos de protecção contra o uso indevido de sistemas de inteligência artificial que possam ameaçar o pleno gozo dos direitos humanos pelas gerações futuras? Em caso afirmativo, quais são esses mecanismos?

Com relação à questão em epígrafe, importa referir que, num universo de 65 países que responderam ao inquérito, boa parte não dispõe de quadro legal específico que aborde de forma abrangente a regulamentação da inteligência artificial e seu impacto nos direitos humanos.

Pelo que, em alguns ordenamentos jurídicos, se está ainda em estágio inicial de desenvolvimento regulativo (são exemplos Angola, Mali, Moçambique) e em outros obtém-se resposta por meio da combinação de vários dispositivos legais, dentre eles a Lei de Protecção de Dados; Lei do Cibercrime; Código Penal; direitos essenciais plasmados na Constituição, como o caso do direito à privacidade, à liberdade, igualdade e expressão.

São disso exemplo Argélia, Andorra, Angola, Arménia, Azerbaijão, Bielorrússia, Brasil, Bulgária, Canadá, Eslovénia, Egipto, Etiópia, Geórgia, Hungria, Índia, Indonésia, Israel, Jordânia, Coreia do Sul, Cazaquistão, Kosovo, Quirguistão, Madagáscar, Mali, Moçambique, Maurícias, México, Mónaco, Mongólia, Montenegro, Paquistão, Peru, Sérvia e Turquia, portanto, 34 países (52.3%).

Países como Burundi, Cambodja, Chade, Comores, Costa Rica, Dinamarca, República Democrática do Congo, Iraque, Marrocos, Mauritânia, Moldávia, Namíbia e Suriname, nomeadamente, 13 países (20%), afirmam que não há mecanismos de protecção contra o uso indevido da tecnologia de Inteligência Artificial que ameace o pleno gozo dos direitos humanos pelas gerações futuras nos seus ordenamentos jurídicos.

Por outro lado, em alguns ordenamentos jurídicos encontra-se protecção através de uma combinação de leis existentes de protecção de dados, obrigações em matéria de direitos humanos e regulamentos da EU (por entenderem que estes estabelecem regras harmonizadas sobre Inteligência Artificial), como é o caso de Alemanha; Áustria; Bélgica; Chipre; República Checa; Croácia; Eslováquia; Espanha; Finlândia; França; Irlanda; Itália; Liechtenstein; Lituânia; Luxemburgo; Países Baixos; Polónia e Portugal, portanto, 18 países (27,6%).

No caso de Moçambique, embora não haja um quadro legal que trate especificamente de matéria ligada aos mecanismos de protecção contra o uso indevido de sistemas de Inteligência Artificial que possam ameaçar o pleno gozo dos direitos humanos pelas gerações futuras, há um esforço em se criar mecanismos institucionais e normativos para mitigar os riscos potenciais associados ao uso abusivo de Inteligência Artificial (IA), particularmente no que diz respeito à protecção a longo prazo dos direitos fundamentais, da equidade intergeracional e dos valores democráticos, a saber:

  • Resolução n. 69/2021, que aprova a Política de Segurança Cibernética e Estratégia da sua Implementação;
  • Proposta de Lei que estabelece o regime jurídico da Segurança Cibernética, que visa responder de forma eficaz e eficiente aos desafios da sociedade de informação, bem como garantir a segurança do cidadão, das instituições, do Estado e a protecção de sistemas de informação e infra-estruturas críticas no espaço cibernético, ao abrigo do disposto no número 1 do artigo 178 da Constituição da República.
  • Proposta de Lei que estabelece o regime jurídico de protecção de dados pessoais, com vista a garantir a segurança de dados pessoais constantes de registos em formato físico e informático, a constituição e as condições de acesso à base de dados, sua utilização por entidades públicas e privadas, tendo em conta os desafios impostos pelas tecnologias de informação e comunicação, em conformidade com a legislação nacional e padrões de boas práticas internacionais, ao abrigo do número 1 do artigo 178 da Constituição da República.

PERGUNTA 5: O seu tribunal já proferiu sentenças relevantes sobre estes assuntos? Poderia, por favor, descrever brevemente?

  1. Países com sentenças relevantes emitidas

Relativamente à questão central, 21 países, mormente, Portugal, Polónia, Áustria, Bielorrússia, Bélgica, Bulgária, República Democrática do Congo, Egipto, França, Alemanha, Espanha, Índia, Indonésia, República da Coreia, Liechtenstein, Lituânia, Maurícias, Paquistão, México, Eslovénia, Turquia, responderam afirmativamente.

Pode aferir-se que foram emitidas diversas decisões relacionadas ao uso de Inteligência Artificial, vigilância tecnológica, direito à informação, liberdade de expressão no espaço digital, limitações à internet, crimes cibernéticos, direito à protecção de dados pessoais, direito ao esquecimento, adaptação do sistema jurídico à realidade digital, garantindo-se de certa forma a protecção dos direitos humanos no contexto das novas tecnologias.

A título exemplificativo, das várias decisões proferidas pelos tribunais, pode-se ilustrar as seguintes: o reconhecimento, pela primeira vez, pelo Tribunal Constitucional Federal Alemão, em 1983, no julgamento sobre o Censo (15 de Dezembro de 1983 – 1 BvR 209/83 e outros), o direito fundamental à autodeterminação informacional, fundado no direito geral de personalidade e na dignidade humana.

Em 2014, nos casos do Twitter (Yaman Akdeniz e outros) e do YouTube (Youtube LLC), o Tribunal Constitucional da Turquia declarou proibições generalizadas de acesso a essas plataformas, porque violavam a liberdade de expressão, visto que a legislação vigente não autorizava o bloqueio completo de sites, mas apenas de URLs específicos por ordem judicial.

A STC 58/2018, de 4 de Junho, do Tribunal Constitucional Alemão, criou uma jurisprudência pioneira em relação ao direito ao esquecimento como uma vertente do direito à protecção de dados, que implica a supressão destes quando já não são necessários em relação aos fins para os quais foram tratados. No caso concreto, obrigou-se um meio de comunicação a desindexar do seu motor de busca determinados dados pessoais do recorrente em amparo, que aparecia no arquivo digital do jornal como condenado por tráfico de drogas em uma notícia dos anos 80.

Depreende-se que 16 países, nomeadamente, Andorra, Angola, Chipre, República Checa, Finlândia, Irlanda, Israel, Itália, Kosovo, Luxemburgo, Macedónia, Mónaco, Moçambique, Eslovénia, Canadá e Hungria deram resposta negativa à questão central, entretanto, reconhecem que o debate sobre o tema está em evolução e que futuras legislações ou decisões judiciais podem abordar directamente as implicações jurídicas da Inteligência Artificial em áreas como protecção de dados, privacidade, acesso à internet e vigilância.

Alguns destacaram a existência de decisões administrativas relevantes (como em casos de uso indevido de dados ou sanções por uso indevido de Inteligência Artificial por advogados), enquanto outros citaram decisões constitucionais, como a admissibilidade de dados de telecomunicações em processos criminais ou a suspensão do acesso à internet em tempos de crise, bem como a experiência na protecção de dados pessoais e diversas decisões judiciais relacionadas ao acesso à internet, privacidade e protecção de dados.

  • Países sem referência 

Destaca-se que 26 países, designadamente, Albânia, Argélia, Arménia, Azerbaijão, Bósnia e Herzegovina, Geórgia, Brasil, Burundi, Chade, Cambodja, Comores, Costa Rica, Croácia, Etiópia, Cazaquistão, Quirguistão, Letónia, Madagáscar, Mali, Mauritânia, Moldávia, Mongólia, Montenegro, Países Baixos, Sérvia e Suriname limitaram-se a dar resposta negativa à questão central.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As respostas dadas pelas cortes constitucionais às perguntas da temática “Acesso ao conhecimento científico e às novas tecnologias” permitiu aferir os níveis de evolução e desenvolvimento desta categoria de direitos fundamentais, em particular, emergentes nos tempos actuais, com destaque para a Inteligência Artificial.

O nível de desenvolvimento económico e social de cada país determina os níveis de acesso ao conhecimento e às novas tecnologias e a promoção de melhorias neste ambiente tecnológico, através de regulamentações e intervenção dos tribunais constitucionais, para assegurar o pleno exercício deste direito.

Ficou patente que os países ainda estão numa fase embrionária de regulamentação da Inteligência Artificial, tecnologia que aumenta o risco de exposição de direitos fundamentais, pois a aplicação Inteligência Artificial é capaz de criar conteúdo, executar tarefas que, normalmente, requerem inteligência humana, tais como aprendizagem, raciocínio, resolução de problemas e reconhecimento.

Portanto, a regulamentação da Inteligência Artificial e o aprimoramento científico das cortes constitucionais para lidar com a nova tecnologia constituem parte fundamental dos actuais desafios globais: ou seja, a legislação e as cortes constitucionais não podem ser obstáculo ao desenvolvimento e inovação tecnológica, mas devem ser capazes de evitar o risco de fraudes, de insegurança cibernética, de violação da privacidade e de outros direitos fundamentais dos cidadãos.

Muito obrigada

pela atenção dispensada

Khanimambo!

Maputo, 29 de Outubro de 2025

Last modified: Outubro 30, 2025

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